31 agosto 2008

Tenho uma cama a minha frente

Tenho uma cama a minha frente.
Na cama estás tu, nua. Tapada.
Num quarto qualquer.
Numa cidade qualquer.

E outro eu que já não sou,
Destapo-te. Olho para ti.
Deito-me ao teu lado.
Abraço-te. Agarro-te.

Estás a minha frente.
O meu dedo percorre
A tua sobrancelha,
Até ao teu pescoço.

A minha mão puxa-te
De contra mim.
O teu cheiro e o meu,
O teu gosto e o meu.

Tenho um espelho a minha
Frente. Eu.
Na memória uma cama.
E tu deitada, nua. Destapada.

Pizzicato


28 agosto 2008

Cais das Colunas

As colunas já lá estão. Não sei explicar o sentimento por as ver lá, embora cobertas de lona e andaimes. Sinto que não estando lá, elas faziam no meu imaginário e consciente parte da minha cidade. Olhei, fui até ao meio das duas, mesmo ao longe senti a linha central que as separa e que corta a estátua ao meio na praça. E que avança Rua fora até se perder no Rossio.
O cais que foi utilizado no inicio da sua meninice, para a travessia do Tejo, ligando a margem norte a margem sul, partindo depois por comboio até ao Algarve, está agora a renascer.
Num outro sentido, mais esotérico, podemos afirmar que é a porta, a entrada para o átrio por onde se chega a Rua Augusta. Para se caminhar.

18 agosto 2008

Já respondi ao que ainda não me perguntaste

Já respondi ao que ainda não me perguntaste. As perguntas que me queres fazer, para ouvires as respostas que queres ouvir.
Ainda não perguntei o que queres que eu te pergunte. Por receio da resposta, decerto ainda não. Deverei ter receio da tua resposta? Se adivinho a resposta como poderei ter eu receio dela? Talvez por não ser a resposta que queira ouvir, decerto que sim. E se a resposta for diferente? Se for uma resposta diferente de todas as respostas que já imaginei?
Não sei.
O que sei é que me apetece perguntar. E com as várias perguntas que te posso fazer, a reposta que eu quero ouvir só caminha num sentido.
Por diversas vezes perguntei. Por outras tantas ouvi a resposta que não queria. A bem da verdade já ouvi, por diversas vezes tambem, a resposta que queria. Mas aqui não se trata de não saber com o que se conta. Pelo contrario, sei com o que conto, pelo menos penso que sei.
E é este pensar que se sabe que me impele para perguntar. Será que sei?
E é neste momento que entra a subjectividade do sentir. Quando dizemos que temos um feeling, uma sensação de que algo mudou, não podemos dizer que temos a certeza. Não é cientifico, somo nós que o sentimos somente. Por cientifico, tomem como real. Lá vem a ciência...
Bom, são estas dúvidas que me assolam, quando penso em ti, quando tomo o real que vejo e lhe adiciono a tua realidade. A tua realidade que imagino ser a tua. E aqui para que a equação tome forma e eu seja capaz de a concluir tenho que ter mais elementos na mão. A maneira mais fácil de os ter é fazer a pergunta. E qual será a pergunta acertada?

Consciência

Existe em nós mesmos uma coisa a que se chama consciência. O que é a consciência? No dicionário consciência significa:

do Lat. conscientia

s. f.,
verdade;
honestidade;
rectidão;
honradez;
conhecimento, ciência;
facto que produz remorso;
cuidado extremo com que se executa qualquer trabalho;

Psic.,
consciência do eu por si mesmo.

- moral: função da consciência que consiste na distinção entre o bem e o mal;
em -: de boa vontade;
meter a mão na -: examinar com atenção os próprios actos ou sentimentos;
objecção de -: acto de recusar servir como soldado;
voz da -: sentimento íntimo que nos avisa do que se passa em nós, dando-nos o conhecimento das nossas acções, aprovando-as ou reprovando-as.

Ora tomando por certo o que acima está escrito, podemos dizer que quando falamos em consciência, esta pode tomar muitos significados, dependendo sempre de como é usada.
Cada um de nós tem a sua realidade, o seu mundo. Ter consciência desta individualidade em nós mesmos é concerteza um degrau que se sobe na escada do conhecimento. Mas, atira-nos para um patamar de incerteza e dúvidas ainda de maior responsabilidade. Se temos consciência do nosso eu, como individualidade única, sabemos portanto que todos os outros tem o seu próprio mundo, a sua realidade única. Uma realidade onde os sentimentos a constroem e propagam.
Esta conciência do outro, enquanto ser que constroi uma realidade única e diferente de como acha que ela é, inconscientemente faz com exista uma inflexão no acto de olhar o outro.
E tomar essas dúvidas como boas é um caminho difícil de aceitar. Eu tomo esse caminho.

07 agosto 2008

Vem lavar-me os pés

Vem lavar-me os pés.
Com água morna e sabão.
Que a toalha na tua mão
Secará com a razão.

Estou a tua mercê.
Qual bicho para matar.
Em sítio árido e plano.
Sem abrigo ou dono.

Encontro água para beber.
Das tuas mãos o copo vem.
A sede morta por ti.
E morta vai. A água fica.

Só a água me mata a sede.
E tu matas e feres a sede que tenho.
E é com os pés lavados e sem sede
Que me recordo de ti.

Existe sempre qualquer coisa

Existe sempre qualquer coisa.
Uma coisa que... assim assim.
Uma outra que nunca.
E outra ainda que talvez.

Qualquer coisa que falta.
Uma insatisfação permanente.
Um sentir fugaz. Uma fuga.
Dificil equilibrio de pés.

Que salta. Que se corta.
Que se cola e se enrola.
E se come e mastiga.
Com os dentes todos.

São muitas as coisas que existem.
São algumas coisas que quero.
Uma que nunca, outra que talvez.
São todas reais. São qualquer coisa.

02 agosto 2008

Soube que nunca iria ser quem eu espero ser

Soube que nunca iria ser quem eu espero ser.
Soube pelas noticias que eu, nunca vou ser
Quem eu quero ser. Saiu nos jornais, na rádio
E nos demais... Eu soube...

E esta certeza é de longe o bem mais
Precioso que tenho de mim.
É aquilo, que me aconchega e liberta
Quando tudo cai. Quando me afogo.

Sombrio e triste avanço pela sombra
Do sol ao encontro do passado.
Ao encontro da noite que me faz
Lembrar o sorriso da tua boca.

De quem é a boca de que eu me lembro?
De nimguém que me ame.
Não me ama. Não existe.
Não vai haver. Sou nada.